Li O Teorema Katherine, do John Green, quando estava prestes a começar uma nova Grande Etapa da Vida, a faculdade. Na época, ainda escrevia no meu finado blog literário e lá falei sobre como a junção de Colin, o protagonista, com a sua obsessão com fazer alguma coisa significativa e grande para o mundo, e Hassan, o melhor amigo que gostava de passar muito tempo assistindo Judge Judy na televisão, pareciam a síntese de uma pessoa comum. (Com pessoa comum eu na verdade só queria dizer não um personagem fictício criado numa história fictícia para te fazer sentir e pensar em coisas específicas, se o autor for bem sucedido). Tenho uma tendência horrorosa a generalizar as pessoas de acordo com quem eu sou e como enxergo as coisas, então não sei se a junção dos dois personagens de fato é a representação de uma "pessoa comum".
Mas sei que a junção dos dois personagens é uma boa representação da minha própria pessoa.
Uma vez, há dois anos, escrevi aqui que o fato de o mundo ser tão grande me conforta. E sigo acreditando nisso. O mundo é grande, tem bilhões de pessoas, e é por isso mesmo que tudo bem. Tudo bem se ontem eu errei colossalmente ou precisei fazer um desvio de emergência ou nem dei a partida. No grande esquema das coisas, é tão provável a gente machucar o universo quanto ajudá-lo, e é improvável que a gente faça qualquer um dos dois, como diria Augustus em A Culpa é das Estrelas, descrevendo a maneira que a Hazel enxergava o mundo (ele só consegue olhar admirado porque quer deixar uma marca). (Uma digressão: A Culpa lida com aquela mesma questão de Teorema, mas por outros meios). Afirmei no meu post que eu não queria ser o centro do mundo, nem especial. Nunca quis.
Mas passei boa parte dos últimos meses lendo e relendo Song for the Special, um ensaio escrito pela Marina Keegan aos vinte e poucos anos e que foi reunido no seu livro póstumo, The Opposite of Loneliness, depois que ela morreu num acidente de carro alguns dias após da formatura. Marina fala sobre como toda geração acredita ser especial por algum motivo ou outro, e que desde crianças somos ensinados de que somos únicos, de que ninguém mais é exatamente como a gente, e que podemos fazer o que quisermos.
Não cresci acreditando ser um gênio como o Colin em O Teorema Katherine, nem nunca tive nenhuma aspiração tão grandiosa quanto as dele. Tudo bem não mudar o mundo. Quase ninguém ganha um Nobel. Um Oscar. Um Pulitzer. Mas cresci ouvindo que eu podia fazer coisas, que eu podia fazer o que quisesse, que eu tinha um grande futuro pela frente. Mas eu era eu, e isso pesava mais do que me confortava. Quando cheguei na universidade, eu era só mais uma no meio de muitos e isso foi bom. Não tinha mais tantas expectativas. Era a tela em branco que eu sempre quis.
Eis que no final do ano, se tudo der certo, vou me formar e dar adeus, mesmo que seja temporário, à universidade. Vou ter um diploma, vou ser graduada, vou ter completado outra Grande Etapa da Vida. E a situação real vivida pela Marina Keegan numa conferência é uma bela imagem do que a vida parece nesse momento:
Tinha tanta gente lá. Continuo achando isso bom. Sete bilhões de pessoas, sete bilhões de possibilidades, como eu afirmei há dois anos. Mas tem tanta gente com as mesmas aspirações que eu, buscando os mesmos objetivos, tanta gente boa, e preparada, e que parece tão mais propensa a fazer alguma coisa, quem sabe até alguma coisa Importante para o Mundo. E eu também nem tenho um cartão de visitas.
Eu não tenho um cartão de visitas e não sei que cara o próximo ano vai ter. Muito menos os próximos cinco anos. Onde você se vê em cinco anos? Não sei. Não tenho certeza. Enquanto isso, parece que todo mundo tem a vida no lugar e, mesmo quando não tem, tem mais ideia do caminho. Marina culpa a internet, onde tudo está disponível e facilmente acessível - incluindo o sucesso alheio. Mas eu não culpo a internet. Porque ela também te deixa ver que o mundo é mesmo muito grande, e tem um universo de pessoas bem maior do que a sua limitada rede de amigos deixa transparecer (por mais incrivelmente sociável e bem relacionado que você seja) - um universo de pessoas com dúvidas, com anseios e, às vezes, sem medo de falar sobre eles. Alguém já teve os mesmos sonhos que eu e deu certo, o que significa que pode dar. Alguém já teve o mesmo sonho que eu e falhou, o que significa que, mesmo se as coisas dão errado, elas podem dar certo de outro jeito, e tudo bem.
O futuro parece muito mais próximo hoje do que já pareceu antes e, como diz a Marina, existe uma chance considerável de que nunca vou fazer nada. É egoísta e egocêntrico pensar nisso, mas me assusta. Me assusta também. Não sou o Colin de Teorema, não tenho nem o sonho distante de ser alguém marcante. Mas queria ser alguém, fazer alguma coisa.
Marina Keegan tinha uma preocupação com a permanência, meio parecida com a do fictício Augustus Waters. Marina, que se preocupava tanto com a possibilidade de talvez nunca fazer nada, tinha feito uma porção de coisas quando morreu jovem demais, aos 22. Ler sua coletânea de escritos me obriga a pensar nesses anseios e inquietações, mas também traz uma estranha sensação de conforto. Marina estava fazendo coisas incríveis, tinha um futuro um pouco mais bem delineado diante de si, e também pensava nisso tudo. Talvez seja egoísta e egocêntrico pensar desse modo, mas nós sempre vamos nos enxergar no outro, não vamos?
O grande e assustador futuro, porque parece muito incerto, domina metade do tempo que eu passo falando. Tenho pensado muito nessa arte:
Nos últimos tempos, minha mente parece muito mais as águas revoltas do mar. Mas estou de férias, morando por uns mesinhos nas praia, e avisto um farol de longe quase todos os dias. É uma lembrança física, presente e impossível de ignorar me lembrando de que às vezes o caos se instaura, mas a luzestá lá para te guiar. Basta levantar os olhos.
Talvez eu não descubra onde vou estar daqui a cinco anos - é bem provável que não. Mas posso reencontrar o farol que sempre tirou minha mente do caos e colocou-o no estado de calma, e acho que é isso que eu quero tirar de 2016, um ano para o qual eu ainda não tinha resoluções. É dois de fevereiro, mas: feliz ano novo.
Mas sei que a junção dos dois personagens é uma boa representação da minha própria pessoa.
Uma vez, há dois anos, escrevi aqui que o fato de o mundo ser tão grande me conforta. E sigo acreditando nisso. O mundo é grande, tem bilhões de pessoas, e é por isso mesmo que tudo bem. Tudo bem se ontem eu errei colossalmente ou precisei fazer um desvio de emergência ou nem dei a partida. No grande esquema das coisas, é tão provável a gente machucar o universo quanto ajudá-lo, e é improvável que a gente faça qualquer um dos dois, como diria Augustus em A Culpa é das Estrelas, descrevendo a maneira que a Hazel enxergava o mundo (ele só consegue olhar admirado porque quer deixar uma marca). (Uma digressão: A Culpa lida com aquela mesma questão de Teorema, mas por outros meios). Afirmei no meu post que eu não queria ser o centro do mundo, nem especial. Nunca quis.
Mas passei boa parte dos últimos meses lendo e relendo Song for the Special, um ensaio escrito pela Marina Keegan aos vinte e poucos anos e que foi reunido no seu livro póstumo, The Opposite of Loneliness, depois que ela morreu num acidente de carro alguns dias após da formatura. Marina fala sobre como toda geração acredita ser especial por algum motivo ou outro, e que desde crianças somos ensinados de que somos únicos, de que ninguém mais é exatamente como a gente, e que podemos fazer o que quisermos.
Não cresci acreditando ser um gênio como o Colin em O Teorema Katherine, nem nunca tive nenhuma aspiração tão grandiosa quanto as dele. Tudo bem não mudar o mundo. Quase ninguém ganha um Nobel. Um Oscar. Um Pulitzer. Mas cresci ouvindo que eu podia fazer coisas, que eu podia fazer o que quisesse, que eu tinha um grande futuro pela frente. Mas eu era eu, e isso pesava mais do que me confortava. Quando cheguei na universidade, eu era só mais uma no meio de muitos e isso foi bom. Não tinha mais tantas expectativas. Era a tela em branco que eu sempre quis.
Eis que no final do ano, se tudo der certo, vou me formar e dar adeus, mesmo que seja temporário, à universidade. Vou ter um diploma, vou ser graduada, vou ter completado outra Grande Etapa da Vida. E a situação real vivida pela Marina Keegan numa conferência é uma bela imagem do que a vida parece nesse momento:
Fui a uma conferência sobre arte em Manhattan na primavera passada, e todo mundo se atropelava para conhecer todo mundo, assegurando sua individualidade como tristes caixeiros-viajantes. (...) Eu não tinha um cartão de visitas. Eu nem tinha pensado nisso. Talvez tenha sido engraçado ou bonitinho, mas só fiquei constrangida. Não tenho um cartão, eu dizia de novo e de novo. (Ha ha!) E sentava em outro painel para fazer anotações e assentir com a cabeça. Tinha tanta gente lá.
Tinha tanta gente lá. Continuo achando isso bom. Sete bilhões de pessoas, sete bilhões de possibilidades, como eu afirmei há dois anos. Mas tem tanta gente com as mesmas aspirações que eu, buscando os mesmos objetivos, tanta gente boa, e preparada, e que parece tão mais propensa a fazer alguma coisa, quem sabe até alguma coisa Importante para o Mundo. E eu também nem tenho um cartão de visitas.
Você pode ser o que quiser, eles nos dizem. Ninguém é igual a você. Mas eu pesquisei meu nome no Facebook e me deparei com oito fotinhos me encarando. As Marina Keegans com suas cidadezinhas e status de relacionamento. Quando morrermos, nossas lápides vão combinar. AQUI JAZ MARINA KEEGAN, dirão. Números um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito.
Eu não tenho um cartão de visitas e não sei que cara o próximo ano vai ter. Muito menos os próximos cinco anos. Onde você se vê em cinco anos? Não sei. Não tenho certeza. Enquanto isso, parece que todo mundo tem a vida no lugar e, mesmo quando não tem, tem mais ideia do caminho. Marina culpa a internet, onde tudo está disponível e facilmente acessível - incluindo o sucesso alheio. Mas eu não culpo a internet. Porque ela também te deixa ver que o mundo é mesmo muito grande, e tem um universo de pessoas bem maior do que a sua limitada rede de amigos deixa transparecer (por mais incrivelmente sociável e bem relacionado que você seja) - um universo de pessoas com dúvidas, com anseios e, às vezes, sem medo de falar sobre eles. Alguém já teve os mesmos sonhos que eu e deu certo, o que significa que pode dar. Alguém já teve o mesmo sonho que eu e falhou, o que significa que, mesmo se as coisas dão errado, elas podem dar certo de outro jeito, e tudo bem.
O futuro parece muito mais próximo hoje do que já pareceu antes e, como diz a Marina, existe uma chance considerável de que nunca vou fazer nada. É egoísta e egocêntrico pensar nisso, mas me assusta. Me assusta também. Não sou o Colin de Teorema, não tenho nem o sonho distante de ser alguém marcante. Mas queria ser alguém, fazer alguma coisa.
Li em algum lugar que as ondas de rádio só ficam viajando cada vez mais longe, voando pelo universo em eternas vibrações. Um dia, antes de morrer, acho que vou arranjar um microfone e subir até o topo de uma torre de rádio. Vou respirar fundo e fechar os olhos porque vai começar a chover bem quando eu chegar ao topo. Olá, direi para o espaço sideral, esse é meu cartão.
Marina Keegan tinha uma preocupação com a permanência, meio parecida com a do fictício Augustus Waters. Marina, que se preocupava tanto com a possibilidade de talvez nunca fazer nada, tinha feito uma porção de coisas quando morreu jovem demais, aos 22. Ler sua coletânea de escritos me obriga a pensar nesses anseios e inquietações, mas também traz uma estranha sensação de conforto. Marina estava fazendo coisas incríveis, tinha um futuro um pouco mais bem delineado diante de si, e também pensava nisso tudo. Talvez seja egoísta e egocêntrico pensar desse modo, mas nós sempre vamos nos enxergar no outro, não vamos?
O grande e assustador futuro, porque parece muito incerto, domina metade do tempo que eu passo falando. Tenho pensado muito nessa arte:
Nos últimos tempos, minha mente parece muito mais as águas revoltas do mar. Mas estou de férias, morando por uns mesinhos nas praia, e avisto um farol de longe quase todos os dias. É uma lembrança física, presente e impossível de ignorar me lembrando de que às vezes o caos se instaura, mas a luzestá lá para te guiar. Basta levantar os olhos.
Talvez eu não descubra onde vou estar daqui a cinco anos - é bem provável que não. Mas posso reencontrar o farol que sempre tirou minha mente do caos e colocou-o no estado de calma, e acho que é isso que eu quero tirar de 2016, um ano para o qual eu ainda não tinha resoluções. É dois de fevereiro, mas: feliz ano novo.